FÓRUM EXTRA
O
Fórum Rastreabilidade de Medicamentos, primeira apresentação
pública do Comitê de Logística Farmacêutica da Abralog, realizada
nesta quinta-feira, 24 de setembro, em São Paulo, mostrou que o tema
é complexo, extremamente importante e que há ainda muitas dúvidas
a serem dirimidas. Há
forte expectativa no setor de que a Anvisa defina alongamento do
prazo para que o piloto comece a rodar.
"Trata-se
de um tema delicado e que vai ter grande impacto ao longo de toda a
cadeia. Serão necessários investimentos consideráveis e há alguma
incerteza e muitas dúvidas, por isso a Abralog abordou o
tema no início de seu novo Comitê”, diz Pedro Francisco Moreira,
foto, presidente da Abralog.
Jean
Djedjeian, coordenador do Comitê, foto, explicou que o rastreamento vai mostrar o medicamento
desde o momento que deixa a fabricação, com identificação nos
blísteres (cartelas com o medicamento), na caixa que o embala e
também na embalagem de transporte, sendo registrados ainda todos
os movimentos até a etapa final. "Esses
procedimentos serão aplicados no controle de toda de qualquer
unidade de medicamento produzida, dispensada ou vendida no território
nacional".
Luiz Thomazinho, conselheiro da
Abralog, explicou que a rastreabilidade foi instituída pela lei
11.903, de 2009, que criou o Sistema Nacional de Controle de
Medicamentos, e que foi regulamentada pela Anvisa por meio da RDC 54/2013. Ou
seja: a indústria farmacêutica titular do registro do medicamento
deverá identificar cada cartucho, disponibilizado para a venda ou
distribuição, com o IUM - Identificador Único de Medicamentos.
Todos os integrantes da cadeia de distribuição deverão
fornecer dados da movimentação dos produtos à indústria
farmacêutica, que perante a Anvisa é a responsável pela
rastreabilidade em todas as etapas do processo.
Um
projeto-piloto tem data para iniciar em 10 de dezembro deste ano,
quando a indústria terá informado os dados de 3 lotes de
medicamentos que farão parte dessa etapa inicial. "A partir de
Dezembro de 2016, a rastreabilidade será obrigatória para todos os
medicamentos comercializados no País”, lembrou Thomazinho. Na base do rastreamento
está o Código Datamatrix, que deve conter número de registro do
medicamento junto à Anvisa, número serial, data de validade e
número do lote.
A extensão e os números da cadeia justificam a preocupação de agora. Fabricantes e importadores são mais de 400, hospitais
privados passam de 5 mil, distribuidores de 300, Clínicas (20 mil),
entidades e cooperativas (5 mil). A lista prossegue com mais de 50
mil farmácias, 2 mil autarquias e fundações, outros 2 mil centros
e postos de saúde, 40 mil salas de vacinação, além das
centrais de 27 estados e de 5 mil municípios. Segundo Luiz
Thomazinho, hoje o processo logístico do setor já é complexo; com
a rastreabilidade, isso vai aumentar muito. A rastreabilidade, no
entanto, é inexorável, é um projeto mundial dentro de um mundo
global.
De falto, ela já está em andamento em alguns países, entre eles Argentina e
Turquia, e em implantação em grandes nações, como os
Estados Unidos. De forma geral, contudo, o processo é lento, dada as
dificuldades. "O processo logístico será impactado em todas as
fases: armazenagem, picking, na devolução das avarias... O mesmo em
relação à tecnologia”, concluiu Thomazinho.
Amilcar
Lopes, CEO da Rastreabilidade Brasil, tocou em outro ponto crucial -
a prorrogação ou não do prazo de entrada em ação do
projeto-piloto, algo aguardado pela maioria dos profissionais
envolvidos. "Meu
conselho é iniciar os preparativos o mais rápido possível; as
empresas devem logo eleger os parceiros que vão operar os projetos.
A rastreabilidade veio para ficar, ela vai gerar valor. Ela é
complexa, sem dúvida, mas existe a lei para ser cumprida. Todos os
elos da cadeia são solidários. Acompanhei a implantação do
rastreamento na indústria de alimentos e bebidas, a farmacêutica é
mais complexa”, afirma Lopes.
Segundo Amilcar
Lopes, cerca de 130 empresas já estão preparadas para a
rastreabilidade. Para ele, os ganhos serão muito grandes, da
confiabilidade de se estar consumindo um medicamente autêntico à
queda no custo do seguro. Com a rastreabilidade, comentou o executivo, todos os
consumidores poderão ver se um medicamento é autêntico ou não,
basta baixar um aplicativo no celular ou computador para comprovar.
O
CEO da Rastreabilidade Brasil acredita que há 90% de chances de o
projeto-piloto ter o prazo prorrogado. No Exterior, diz Lopes, é
reconhecida a dificuldade de implantação da rastreabilidade no Brasil, em
função dos elos envolvidos e de sua complexidade - fabricante que
fabrica, fabricante que importa, fabricante que fabrica para
terceiros. "Como dizem lá, não é assunto para criança. Quem
fizer para o Brasil terá como fazer para todo o mundo”.
Alexandre Sanai, gerente do Laboratório Libbs, lembrou que sua empresa começou a
estudar o assunto há quatro anos e está com o
projeto-piloto pronto para rodar. Depois desse tempo todo ainda há dúvidas, informou Alexandre Sanai. A
rastreabilidade, na sua opinião, é fato; falta apenas acontecer.
Ele acredita que os operadores logísticos ainda não estão prontos
para o processo, no qual vê muitas vantagens, entre elas o controle
e a segurança, mas também o custo de inscrição de dados nos medicamentos
do fabricante. "Hoje, nessa área, temos 140 funcionários
trabalhando”, exemplificou.
Líder do
projeto de rastreabilidade na Johnson & Johnson, o executivo Leandro Oliveira, ao falar dos
avanços obtidos, disse ser favorável a um cronograma com maior
tempo para execução, além de um trabalho junto a Anvisa para criação de
um texto que melhore o previsto na RDC 54. Informou ser ainda
desejável a consolidação de tudo o que já foi produzido até
agora pelos diferentes grupos técnicos das empresas e associações
evolvidas.
Ao comentar os contratempos, Leandro Oliveira citou
como uma delas a dificuldade de contato com parte do varejo do setor. Também
lembrou que os principais provedores de rastreabilidade tem abordagem
de cima para baixo, e que a Anvisa não publicou todas as normativas
previstas, além de interromper as reuniões e discussões com os
comitês formados em 2014.
Como recomendação ele sugeriu que
se mantenha foco em um piloto envolvendo todos os setores,
pediu maior cooperação entre associações e entidades
envolvidas e que as empresas aproveitem eventual adiamento dos prazos
para discutir, efetivamente, o modelo de rastreabilidade que irão
adotar.
O
que muda na operação? Adriana Oliveira, gerente de Qualidade do operador
logístico RV Ímola, informou que haverá necessidade
de uso de leitores bidimensionais na operação de recebimento,
armazenagem, expedição e na entrega no destino final, o que exigirá capacitação do pessoal operacional para utilizar o novo sistema.
Além disso, o sistema de comunicação com os clientes terá de ser
definido para envio em tempo real das informações referentes ao
rastreamento dos produtos. "A maioria dos operadores logísticos já
atua com sistema de monitoramento on-line das cargas, por meio do
qual é possível rastrear as cargas via romaneios/nota fiscal, e,
portanto, em tese, associar o número do IUM à nota não deverá ser
um problema”, afirmou.
Ela enumerou algumas vantagens da rastreabilidade: redução
do tempo nas diversas etapas do processo (recebimento, conferência,
expedição); menor número de perdas por vencimento; otimização
dos recursos humanos; garantia dos registros realizados
eletronicamente; redução de riscos gerando maior segurança
nos processos; recuperação de informações históricas e
geográficas sobre o caminho percorrido pelo produto;
e sustentabilidade ambiental pela diminuição no consumo de papel.
Fernando Correia, gerente-geral da
Transportadora Andreani, com sede na Argentina, mostrou aos
presentes a experiência da empresa com o trabalho realizado naquele
país, onde a rastreabilidade já foi implantada. Segundo ele, o
segredo para uma rastreabilidade segura passa pela integração entre
os sistemas de informação do laboratório e o do operador
Logístico. "Deve haver uma tecnologia de ponta e softwares
especializados para suportar a demanda, garantindo as qualidades dos
produtos e dos processos”, afirmou.
Segundo Fernando
Corrreia, a vivência argentina levou à constatação de que o
operador logístico precisa ser o administrador da solução, e não
apenas um utilizador. "A solução logística de rastreabilidade
liderada pelo operador permite que o produto seja entregue de forma
coordenada, evitando atrasos e processos ineficientes. A
administração da informação facilita a gestão das diversas
transações”, garantiu.
O hospital Albert Einstein também
levou sua contribuição sobre rastreamento. A instituição, uma das
referências em saúde no País, participa, desde janeiro de 2014,
com 24 outras entidades, das reuniões mensais do Comitê Gestor do
Sistema Nacional de Controle de Medicamentos. Nilson Gonçalves
Malta, farmacêutico que coordena a rastreabilidade no Einstein,
explica porque a instituição é totalmente favorável à
iniciativa: "Para nós, a rastreabilidade é a segurança do
paciente que está sendo levada em conta, e nós sempre pensamos em
primeiro lugar no paciente”.
A realidade nos hospitais é
muito diferente da existente ao longo da cadeia. Malta explicou
que poucos hospitais controlam o estoque por lote e para exemplificar
deu exemplo do próprio Einstein. Lá, cada medicamento é
reembalado e recebe um código de barras, pois a instituição administra aos pacientes doses de medicamentos, não caixas. Para
se ter idéia do tamanho desse trabalho, 200 mil unidades são
reembaladas por mês. O Hospital Albert Einstein conta com projeto-piloto em andamento e mantém em espera a adoção de nuvem e customização
de ERP.
Jorge Froes Aguilar, diretor-executivo da Abafarma, a
Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico, disse em sua
apresentação que o projeto-piloto dificilmente começará a rodar em
dezembro deste ano, como está previsto. Há menos de 75 dias do início
programado, com a suspensa das reuniões que a Anvisa promovia, além da troca de diretoria, ele acredita que o prazo será
postergado.
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